Encontrou essa cidade, numa tarde lenta e quente, pesada como a chuva que se anunciava.
Quando ali saltou, saber não sabia se era o lugar em que as coisas não se findavam. Apenas lhe tocou a esterilidade nos olhos vazios dos cidadãos que iam e vinham. E sentindo em si um crescente e igual vazio, estacionou. A enxurrada desse vazio arrastou tudo que ela trazia de dor ou alegria.
- Onde é aqui? - perguntou ao motorista do caminhão..
- Aqui pode lhe servir, dona, a senhora que disse que foge do adeus - respondeu em voz alta em meio riso.
Ela saltou menos decidida que a sugestão do motorista; este que acelerou o veículo fazendo atrás de si um desenho de fumaça suspenso no ar. Estranhamente esse um gesto de adeus.
Que fosse o último que visse, pensou
E olhou para a mala concisa que trazia todo o adeus que lhe pertencia. A primeira despedida foi a do irmão, o pequeno, o "raspa de tacho", o que trazia luz à família tão migrante, tão perdida, tão dele dependente, a flor nascida naquele chão estrangeiro. Um dia se foi, morreu e deixou a dor de um adeus sem fim. O segundo, logo atrás, foi o adeus da mãe, levada pela tristeza pela perda do filho, de tantos o mais querido. A mãe tão bonita que morreu dia a dia, na despedida anunciada como os rufos de um tambor de um condenado, condenando a todos com a sua iminente e definitiva partida. A terceira despedida se prolongou por lentos anos de um adeus solitário. Foi a da irmã perdida pelo tempo e pela vida, aquela que se foi sem dizer o porquê e que marcou sua ausência na sua presença constante, anunciada nas redes, contando sua nova vida. Seguidas às tais, vieram outras tantas fundas despedidas. No ventre, o filho que não vingou; a alienação do pai em seu esquecimento, a perda do grande amor, a perda de si mesma num lugar a que não mais pertencia.
Nem um adeus a mais haveria. Foi o que pressentiu da misteriosa fala do motorista dando ares de brincadeira, mas que afirmou "aqui não paro", ainda que ela sugerisse ao homem refrescar-se na cidade, após longa estrada de viagem sob sol a pino e água escassa no cantil...
Nessa cidade sem adeus decidiu que fincaria a sua estaca de começos. A chuva anunciada desabou...
(continua em breve...)
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