Faz um tempo que não visito o meu amor. A peste contemporânea ampliou as distâncias e reinventou formas de amar que ainda estranhamos. Faz tempo que não vivo o meu amor por você.
Lembro, saíamos de mãos dadas vagando, misturando-nos à multidão das ruas...
Em calçadas bonitas de bairros protegidos ou nos lugares da ausência de Estado e de calçadas, ali nas quebradas, vivíamos nosso amor errante, sem previsão de programas, tempo e temporal. (Quantas vezes nos amamos sob marquises aguardando o cessar da chuva e dividindo espaço com aqueles que fazem do amor um outro negócio, que também faz parte desse nosso amor! Como não?)
Passeávamos por culturas, uma inusitada comida, uma festa ou uma passeata de ciclistas nus levando flores ao túmulo da outra, que foi atropelada pelo ódio, na via exclusiva de ciclistas. E no lusco fusco de poente com fumaça, íamos nos levando, recebendo a noite entre tiroteio e cachaça.
Chegávamos em casa na madrugada e ainda nos pendurávamos junto à janela esperando sabe-se o quê, com olhos ávidos na vida vista do alto do edifício, de sob o viaduto ou das estrelas que ainda piscavam no ar. E topávamos com essa vida que também já vinha correndo. em sentido oposto à madrugada que termina para a madrugada que começa em trens, ônibus, metrôs, lojas acendendo o dia para mais um outro dia.
Eu sempre perdi para o sono, pondo nosso amor em espera. Você não, você nunca dorme, cuidando em vigília para continuar e continuar nesse seu compasso sem parada e de todos os ritmos.
Hoje vi você festejada. Percebi que já não tem o mesmo talhe de altivez, juventude e irreverência. Finalmente, está mais velha, um tanto decaída pela convivência mais brutal da dor e alegria destes tempos mais hostis que cimento.
Mas você ainda carrega todo o seu charme e o meu amor meio cansado. Ah, esses avessos infinitos em que nos desdobramos para dançar nos seus braços e nos sentirmos pertencidos à sua dureza, realidade e sonho! Qual!
Parabéns para você, pelo seu aniversário e por, apesar de todo o tempo e reviravolta da vida e da morte, não deixar de prosseguir sendo você e eu e todo o mundo que você carrega como dom e como sina.
Parabéns, São Paulo, a grande Sampa de todos os afetos e dos meus afetos.
São Paulo, 25/01/2022 ❤️
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