O Esperado

 A dor sua era tanta

de vê-lo ir embora

que ela se despedira dele

na chegada

Inúteis riso e febre do corpo

oferenda e consumação

Não o teve, retornado

Não o teve, junto de si

Haikai da Evaporação

O amor morreu

a memória morreu 

e meu celular já não anda nada bem

Pão e Açúcar

Havia a história de um homem gentil, de alma gentil, de sorriso, lábios, olhos gentis, cujo labor tinha a gentileza do prazer da mesa. E também a história dela, mulher gentil de olhos compassivos, que se encontrou com esse homem gentil. 

Ambos viviam seu amor gentil, de seu modo gentil num mundo à volta que tendia a atropelar gentilezas. 

Até que esse mundo realmente os atropelou e eles passaram a ser duas pessoas tristes, perdidas e gentis, no tal  mundo moenda que, somente assim, os aceitou. 

E o tempo moído nessa moenda se foi passando ao largo, claro, de qualquer gentileza... Tristes gentis!

Mas se cansaram de se verem tão gentis e melancólicos. No horário do almoço,  num canto da praça, rodeados por pombos bicando farelos no chão, sussurraram, entre si,  em gentil ousadia: " - Foda-se o mundo!". E riram baixando os olhos nessa contenção que brota de uma elegância de alma, genuína da figura gentil.

Foi um "foda-se", mas um "foda-se" sem ofender de fato ninguém, pois tão gentil que todo o mundo quase nem percebeu nem ouviu. (Foi para poucos que a poeira desse açúcar espargiu sobre instante espumoso; e para esses poucos, logo, logo, a vida  retomou sendo a mesma com suas mesmas amarguras.).

Só ele e ela souberam - e lhes bastou - daquele definitivo despertar que os pôs de volta a si mesmos, a seu amor do jeito que eles sabiam amar,  do seu modo de ser assim, pão e açúcar,  gentil.

Essas almas

Apesar da tristeza

Elas trazem uma alegria

Ínsita e simples

Aquela alegria das cores primárias

Do quotidiano como surpresa

Das bençãos à pouca mesa

Apesar da incerteza

Elas vivem tão certas

De que há certa beleza

Na exiguidade rotineira

Dos sonhos tão incertos quanto a verdade

Emitida  de uma tela de imagem

No valioso leite aguado dos meninos

E na sopa rala que aquece a noite fria

Deus vai provendo todo o alento, alentando

De farinha, açúcar e vento, a massa

E o duro sorriso fácil no raiar do dia