terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

All You Need is Love

 ALL YOU NEED IS LOVE

Hoje, ouvia no rádio a música Michelle, dos Beatles, e me lembrei de um filme com Sean Penn, em que seu personagem, mentalmente limítrofe e fanático pelos Beatles, explica a um juiz de custódia que, quando Paul fez a música Michelle e a mostrou para John Lennon a saber sua opinião sobre se faltava algo, este apenas acrescentou o verso "I Love you, I love you, I love you" e o álbum com a referida música foi o mais vendido dos Beatles até então.
Na conversa entre Lula e Leonardo Boff, hoje também, a tônica foi o amor em todas as suas formas e Lula, ao fim, pede que as pessoas falem mais de amor, vivam o amor, porque é do amor que nasce o sentido de todas as lutas. Não foi à toa que Guevara exortou os revolucionários do mundo à ternura como uma das faces da força.
Vivemos tempos muito, muito duros, sem muita fé no futuro, sem muita fé nas pessoas, sem muita fé na fé. Mas o que mais se quer e precisa no meio do deserto senão justamente a água? Em meio a tanto ódio, é necessário ter coragem de falar de amor.
A necessidade é algo que tem uma natureza transitória e, se ela persiste, vira o sofrimento. E o sofrimento também não é o estado de ficar, mas de passar.
É preciso oferecer o que cesse o sofrimento, e a isso se chama amor solidariedade. Mas não acaba aí. É a tal água da ternura a que mata outras sedes, lava a mão, torna o sujo limpo, o feio belo, a que nos reflete como espelho e nos revela gente. Esse é o amor apenas amor, tão presente nas coisas pequenas, descuidadamente alegre.
Lula é um político desigual que nunca teve medo de falar de amor, um pregador do deserto, do deserto das almas, das ilusões, da esperança. Ele viu que é dessa água que se trata.
A alegria é o lugar de ficar de todo ser vivente, é a sede saciada, a alma lavada, a beleza nascida do estado de bem querer ido e vindo.
Estamos, por ora, combalidos, extenuados da dor que nos mira do espelho e da que nos olha da janela. E fomos levados a entender que a dor é uma só, porque dor é dor por quem quer que a sinta e, onde ela dói, toca em toda parte. De todas as dores, a dor.
É preciso, pois, falar de amor para arrefecer a dor-uma, nossa e de todos; é preciso fazer o amor.
Então, se canto outra canção que não a sua, por favor entenda, que ainda que seja outra, mais uma, mais um milhão, a última canção, importa é que seja uma canção de amor. Ouça e se deixe levar. "I love you!".

sábado, 13 de fevereiro de 2021

SENTA QUE LÁ VEM FILME : "Malcolm & Marie"

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                                    (Os atores John David Washington e Zendaya, em cena do filme "Malcolm & Marie")



"Malcolm e Marie", do diretor  Sam Levinson, narra a noite intensa de um casal que retorna de um prestigiado lançamento de um filme escrito e dirigido pelo personagem Malcolm e a roupa suja que então se lava, numa afiada e dolorosa discussão, que tem por estopim um deslize cometido pelo homenageado na hora dos agradecimentos pela ovação de seu filme.

O tal fato traz à tona toda uma teia de sentimentos, impressões, dúvidas e mágoas que cada um daquela dupla tem em relação a si mesmo e em relação ao consorte.

Nessa discussão, que transcorre entre diferentes temperaturas e que chega às margens de questões bem perturbadoras, nas quais, não raro, nos reconhecemos em alguma medida, se vê o quanto é comum se reproduzir sobre os mais próximos tudo o que se gostaria de obter e não se obtém do entorno, do mundo de fora, e a explosão para outras direções dessa frustração abafada.

"Malcolm e Marie" traz à tona, num diálogo muito bem elaborado, atuações impecáveis da dupla de atores, uma trilha sonora lindíssima com jazz, blues e soul dos grandes,  e em meio a um ambiente em preto e branco, questões que vêm do subterrâneo das relações amorosas, sociais, políticas e humanas. Estão, por exemplo, no mesmo patamar de importância e significado, desde um macarrão com manteiga que a mulher prepara para matar a fome e acordar a realidade, quanto o discurso revoltado do personagem cineasta em relação à crítica recebida da mídia branca, que julga a qualidade de seu filme exclusivamente pela perspectiva de se tratar de uma obra feita por um negro. E, no entanto, esse reconhecimento pretendido o mesmo cineasta avaliado não o devota à sua companheira, talvez pelos mesmos caminhos do olhar percorrido pela jornalista que fez a crítica de seu filme.

Marie, por sua vez, como o companheiro Malcolm, com todas as armas que ambos têm e poderiam usar e se libertar, não toma nas mãos o que realmente quer, apenas esperando passivamente, até aquela noite, que lhe seja entregue tudo o que julga lhe pertencer. E nesse caldo se diluem questões raciais, de gênero, as falas engolidas e a velha história do medo e do egoísmo mesmo (ou principalmente) numa relação de amor. Demasiado humano!

É um filme que fala sobre se ir despindo até a grande nudez da honestidade, como no decorrer da película em que se dá a retirada gradativa de roupas, desde a chegada em casa do casal com suas vestes de gala, até a paulatina perda do glamour festivo com a deposição dos adereços e modos de cada um.

 Basicamente é um filme sobre a luta que se trava entre usurpar e buscar tomar de volta. E o que pode se salvar de tudo isso sem as fantasias ou máscaras (não estamos, afinal, para Carnaval). Mas também é um filme que fala de ternura, da ternura que nos calça para andarmos pelos cacos estilhaçados no chão, até o apagar da última luz.

Lindo filme!




segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Amor que volta


 


O meu amor por você

Pensei que houvesse fugido

Tivesse saído pelo mundo

Por trilhos em velhos trens


Talvez descendo nas estações

Pobres e quietas com cheiro

De doce de quitanda


Talvez já sepultado

Sob folhas de jasmins

E contado em única linha de um epitáfio:

"Meu amor por você"


E eu olhava da janela o céu

E o dia, calma e vazia,

Já o dando por perdido


Na tarde de  fim de junho,

Sem razão, explicação ou palavra

Reaparece o meu amor por você


No portão, vermelho sob o sol vespertino

Disse "oi" e entrou

Sem recíprocas ou expectativa

Apenas o meu amor por você


Meu amor por você não pulsou

Não trouxe êxtase ou espanto

Trouxe-me a mim o meu amor por você

Voltou o meu amor por você!