Cafarnaum, filme multipremiado de Nadine Labaki, não é, como muitos poderão pensar, mais um filme sobre pobreza. Não, não é mais um: é o mesmo. É o mesmo e eterno enredo sobre todos os tipos de miséria.
É um filme bem feito, belo, de um raro olhar de ternura pra essas coisas nascidas no meio de tanta indiferença humana. É um filme materno.
Não há heróis ou vilões ali apresentados. Como na vida, eles se diluem e se misturam como água e sal, numa bebida difícil de engolir. Não os há, porque a vilania ou heroísmo são, na dura realidade da pobreza, do descaso, do abandono, da naturalização da dor alheia, irmãos provindos do mesmo tronco genealógico de um intrincado sistema desumano. O ápice de ser gente está no limite de não o ser e sobre(viver). É qual um grito de um feto que do ventre pede, por amor à vida, que o aborte; "importe-se com minha vida".
Como disse o pai do personagem central, numa entre tantas falas agudas dos personagens, "somos insetos, não existimos", pra uma criança com olhos de adulto que busca um documento que lhe garanta, ao menos, uma existência oficial. Nem isso.
Cafarnaum tem por tema central a grande indagação sobre o direito de existir e por que isso não é o natural, ao contrário, algo caro a se conceder.
Mas insisto, é ainda um filme que lida com um material possível de ternura, emoção de gente, porque gente é o que está ali, ainda, embaixo de tudo.
Prepare-se para se emocionar. Ninguém consegue sair indiferente da sala de exibição. É quase uma assinatura numa nota promissória (sem avalista!).
SP/ FEV2019
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