Lembro da indicação do Papa Francisco e sua eleição e que muitos amigos, não só de aqui desta rede, lógico de convicções políticas progressistas, mas de vivência de vida real criticaram minha expressão de grande esperança por sua jornada. Muitos relacionando sua suposta contribuição para o regime ditatorial na Argentina.
Na época, ponderei que acreditava no poder do arrependimento e que seu histórico mais recente indicava um sacerdote completamente comprometido com a causa dos pobres e necessitados. Logo após, vi o aval de Leonardo Boff e, então, pronto, fui dormir em paz.
Confesso que o fato de ele escolher o nome Francisco e ser Argentino ( quem me conhece de perto sabe o imenso apreço que tenho por essa gente, que, recentemente, mostrou sua capacidade aguerrida de recuperar seu norte com a eleição de um governo de esquerda, depois de um baita erro e, assevere-se, sem golpe e sem perder a democracia. E, além disso, tem Maradona e Gardel e o tango...) influenciaram muito meu olhar condescendente. Mas não foi só isso.
Bem, já conheci algumas religiões e cheguei à minha própria conclusão de que elas não são a representação do divino, mas uma construção humana com todas as falhas e erros dos homens, em sua eterna relação de poder e medo. Minha ligação de fé é direta com Deus e Jesus e a natureza. Sim, sou uma simpatizante comunista que acredita em Deus.
Então, por que motivo meu encantamento com esse líder espiritual?
Justamente por esse seu olhar para as misérias humanas, todas e não só a material.
Ele é um cara que traz Jesus pra terra, como tão bem relatou o samba enredo da Mangueira. Um cara que reensina o que é fé, conectando-a exclusivamente com nossa relação de amor às pessoas, ao bem coletivo, tenhamos ou não convicções religiosas.
Esse homem cumpre seu papel de amor sendo exemplo de amor, a trancos e barrancos, expondo fragilidades, medos, erros, tentando incansavelmente aliviar dores, como cada um de nós pode e deve fazer.
Ao ver essas imagens, eu não vejo Francisco sozinho. Vejo, ao contrário, um homem rodeado de compaixão ao lado de seu rebanho chamado gente. E esse gesto amoroso me alcança, me toca, me afaga neste momento tão duro e isso me relembra minha capacidade, ou mais, meu poder de também amar e acalentar. Essa chama que, para mim, se chama Deus.
Pandemia, 27/03/2020