segunda-feira, 21 de março de 2022

Pelo Homem do Mundo

27/03/2020
 


Lembro da indicação do Papa Francisco e sua eleição e que muitos amigos, não só de aqui desta rede, lógico de convicções políticas progressistas, mas de vivência de vida real criticaram minha  expressão de grande esperança por sua jornada. Muitos relacionando sua suposta contribuição para o regime ditatorial na Argentina.


Na época, ponderei que acreditava no poder do arrependimento e que seu histórico mais recente indicava um sacerdote completamente comprometido com a causa dos pobres e necessitados. Logo após, vi o aval de Leonardo Boff e, então, pronto, fui dormir em paz. 


Confesso que o fato de ele escolher o nome Francisco e ser Argentino ( quem me conhece de perto sabe o imenso apreço que tenho por essa gente, que, recentemente, mostrou sua capacidade aguerrida de recuperar seu norte com a eleição de um governo de esquerda, depois de um baita erro e, assevere-se, sem golpe e sem perder a democracia. E, além disso, tem Maradona e  Gardel e o tango...) influenciaram muito meu olhar condescendente.  Mas não foi só isso.


Bem, já conheci algumas religiões e cheguei à minha própria conclusão de que elas não são a representação do divino, mas uma construção humana com todas as falhas e erros dos homens, em sua eterna relação de poder e medo. Minha ligação de fé é direta com Deus e Jesus e a natureza. Sim, sou uma simpatizante comunista que acredita em Deus.


Então, por que motivo meu encantamento com esse líder espiritual?


Justamente por esse seu olhar para as misérias humanas, todas e não só a material. 


Ele é um cara que traz Jesus pra terra, como tão bem relatou o samba enredo da Mangueira. Um cara que reensina o que é fé, conectando-a exclusivamente com nossa relação de amor às pessoas, ao bem coletivo, tenhamos ou não convicções religiosas.


Esse homem cumpre seu papel de amor sendo  exemplo de amor, a trancos e barrancos, expondo fragilidades, medos, erros, tentando incansavelmente aliviar dores, como cada um de nós pode e deve fazer.


Ao ver essas imagens, eu não vejo Francisco sozinho. Vejo, ao contrário, um homem rodeado de compaixão ao lado de seu rebanho chamado gente. E esse gesto amoroso me alcança, me toca, me afaga neste momento tão duro e isso me relembra minha capacidade, ou mais, meu poder de também amar e acalentar. Essa chama que, para mim, se chama Deus.


Pandemia, 27/03/2020

SENTA QUE LÁ VEM FILME: "A MÃO DE DEUS".

A cena  explícita de uma mulher velha que inicia sexualmente um menino de seus dezessete anos é um dos tantos momentos de poética beleza do filme A Mao de Deus, do diretor Paolo Sorrentino, na NETFLIX. 


A cena encarta grandeza, delicadeza e erotismo, de modo inesperado e natural, considerando toda a forma de aparente "distanciamento" dos personagens envolvidos. Um recorte cheio de mensagens simbólicas e também concretas sobre as surpresas que a vida tem!


O filme retrata o inexorável fluir do tempo e o rearranjo de desejos e sonhos diante dos  percalços da realidade, apontando a imprescindibilidade de prosseguir. Fala sobre olhares.


"- Agora vá, já cumpri minha missão: fazer você olhar para o futuro. " 


Ela diz, fumando um cigarro, ao homem recém nascido de entre suas pernas. 


Filmaço!


São Paulo, 18/12/2021

quinta-feira, 10 de março de 2022

O Parto

    


    






Eu preciso que saiba que não está só. 
Não está só nesta angústia e neste espanto. 

Como semente que se contorce
da sombra da terra para a luz, 
estamos estupefatos com este fulgor. 
Doemos. 

É duro, eu sei, lidar com o encontro de uma busca. 
Estou sem fôlego, sem ar, sem sono. 

Como tratar, tão de repente, esta não solidão que a vida oferece?  
Deixamos de ser sós, aquela solidão que nos acompanhou pela estrada.

A emoção dessa epifania transborda. 
Afogamos como numa onda que inunda uma cidade. 
Ah! Sem fôlego, sem ar, sem sono...

Eu estou embriagada de medo como você. 
Sabemos que é mútuo e único o caminho de verdades a descoberto.
Como trilhá-lo? Como resistir a deixar de trilhá-lo?
Sem fôlego! 

Venha! Fujamos de medo 
para não por na língua tal doçura fácil
que desconhecemos!

O nosso sofrimento é o êxtase, 
o êxtase insuportável desta quase insuportável alegria. 
E até isso teremos de aprender
aprender a viver com a alegria. 

É isso: nossa dor é este êxtase de parir esta alegria.

sexta-feira, 4 de março de 2022

Das Coisas que a Lua Conta - O Riso do Amor

 



O humor é primo irmão do amor

Toda a vez que um do outro se aparta,

saibam todos, algum amor morreu

Morreu para ambos, morreu para um


Posto, então, se virem alguém absorto,

detido em pregada lembrança

E seu semblante revelar um sorriso

ainda que esmaecido por sombras


Podem ter a certeza que tal criatura

sozinha não está 

Está em cadenas, entrelaçada, 

na dança risonha de alguma lembrança

de uma lembrança de amor.